sábado, 30 de outubro de 2010

Fazendo o Walt Disney girar na própria tumba

Tenho vontade de processar o Walt Disney. Pena que o senhor já tenha morrido e nao possa ir a tribunal.
O problema é o seguinte: houve geraçoes inteiras a crescer com demasiadas fantasias. A minha ainda foi uma delas. Talvez pertença à última geraçao ingénua, mas nao tenho especial orgulho nisso. Acho que as crianças deviam ser ensinadas desde cedo a ver a realidade. E isso nao tem nada de infeliz, se a realidade for demonstrada como sendo uma coisa boa. As crianças podem continuar a ser crianças, mas pelo menos já estao mais alerta da realidade, porque rápido o contos de fadas se tornam em contos de bruxas porque crescemos demasiado dependentes da ficçao, e a ficcao é, como o próprio nome indica, ficçao. A sinceridade tornar-nos-ia a todos mais preparados para viver a vida em pleno, se desde um princípio fossemos instigados a conhecer a verdade, a saber lidar com ela e a sermos felizes incondicionalmente.
Comecemos pela demonstraçao de que todos esperamos pelo grande amor. As mil e uma histórias que nos contam o encontro afortunado de dois seres que se apaixonam têm o seu quê de mágico, e é uma mensagem válida, boa e bonita. Mas nao é totalmente honesta. Acredito que existam várias pessoas especiais e nao apenas uma. Nao acho no entanto que devessemos descartar-nos de uma pessoa sempre que nos fartamos dela para ir a correr atrás de outra nova, mas as relaçoes seriam todas mais facéis se nao houvesse tanto o sentimento intrínseco de obrigatoriedade, porque o 'para sempre' acaba por assustar. Se nao houvesse essa cultura do 'para sempre', acredito que as coisas até seriam, efectivamente, mais duradouras. Acredito que estariamos todos mais preparados para dar e receber amor.
Mais importante que isso, devia ensinar-nos, em primeiro lugar, a sermos felizes conosco próprios e nao a estar incessantemente na busca do príncipe encantado, ainda que haja à mistura uma vontade natural e fisiológica de procurar um par. Mas se nao soubermos ser felizes sozinhos, acredito que ninguém será feliz, mesmo ao lado da 'alma gémea'...
A cereja no topo do bolo é, claro está, o "e viveram felizes para sempre", porque depois o Walt Disney nunca mostra a realidade do dia-a-dia desse casal. Pressupomos entao que tudo será perfeito, nao haverá discussoes, nao haverá duvidas, nao haverá tristezas nem dias menos bons, porque eles vivem sempre felizes para sempre. Pressupomos tambem que nunca existem separaçoes, e que a separaçao é completa e inequivocamente um erro crasso.
É por essas e por outras que há tantas crianças a sofrer com o divórcio dos pais. Mesmo que os pais vivam uma separaçao saudavel e nunca deixem de dar atençao aos filhos, já houve uma quebra quase irrecuperável na cabeça infantil e formatada pelo "e viveram felizes para sempre". O pior mesmo é que sao raras as separaçoes saudaveis, porque os próprios pais nao sabem lidar com a imperfeiçao.
Vivemos obsecados com a ideia da perfeiçao, chateamo-nos facilmente com coisas sem importância, nao aprendemos a olhar o outro como uma parte de nós mesmos. Vivemos também obsecados com a ideia de que o eterno e permanente só existe com um casamento. Quando, na realidade, após conhecer uma pessoa e viver com ela momentos de terna alegria, o mais certo é que essa pessoa permaneça na nossa vida para sempre, independentemente de estarmos casados ou nao com ela, independentemente de termos, entretanto, encontrado um novo amor. Acredito profundamente que ninguém substitui ninguém.
No entanto, graças ou nao ao Walt Disney, tenho a tentaçao de dizer: o amor é bonito. Duas pessoas juntas formam um todo mais coeso. Mas ninguem é perfeito. A perfeiçao está nas nossas intençoes de sermos felizes e fazer alguem feliz, mesmo nos dias de chuva.

P.S. após ler o meu texto outra vez deparei-me com uma serie de erros que entretanto já corrigi. O castelhano está, sem dúvida, a atrapalhar o meu português. eheh

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Cérebros comandados

Atravessamos actualmente uma crise... a dos cérebros comandados. 
Quem é que já não se perguntou "Porque tenho eu de me levantar às 7h da manhã e estar numa sala de aula a decorar símbolos químicos que depois vou esquecer em poucos dias?"
Ok, não estou a querer dizer que a educação é dispensável, antes pelo contrário. Apenas reflito acerca dos meios usados para que essa mesma educação chegue até nós, não de chicote em riste, mas é quase como se fosse (eu cá nunca gostei de acordar cedo). 
Os países de todo o mundo estão ávidos de sucesso económico, e isso leva-os a contrariarem a tal democracia na qual pensamos todos viver. Estão a ser criadas máquinas dóceis e tecnicamente qualificadas, em vez de cidadãos realizados e felizes, capazes de pensarem por si mesmos. 
E porque vem à baila agora este assunto? Porque me sinto pouco realizada dentro da minha sala de aula, onde tenho de estar permanentemente em alerta, não vá o professor perguntar-me algo sinistro e, em caso de sair babuzeira da minha boca, levar com aquele olhar "tu és um bocado estúpida e daqui vais para o desemprego".  
Vejo que as Humanidades e as Artes estão a perder terreno, mesmo até nas áreas supostamente artísticas, como a minha. Animação 3D tem muito de técnica, mas também devia dar-me a liberdade suficiciente para criar. E até a tenho...simplesmente porque eu não ouço o professor. 
As artes são acessórios inúteis e há que combater o superfluo para sermos competitivos no mercado mundial, é por aí o caminho que estamos a seguir. O importante é rodearmo-nos de bens que nos satisfazem e consolam, porque nós já perdemos a capacidade de ver dentro de nós mesmos algo que nos satisfaz e consola.  O pensamento e a imaginação estão pregados num alvo, prontos para levarem um tiro, porque aquilo que faz de nós humanos nem sempre é utilitário. 
Este espírito competitivo que está a ser injectado nas crianças e jovens cega-lhes uma faculdade muito importante: a de ver no outro um outro nós. O sentimento de dedicação ao outro implica que o vejamos como ser humano e não como obstáculo. Mas o mundo competitivo é assim. Se não sabes a tabuada toda de 'cor e salteado' não levas uma reguada porque isso é do tempo da 'outra senhora', mas possivelmente, se não trabalhares a tua imaginação e engenho cigano, irás ser um daqueles desgraçados que vai para o pub da esquina mamar imperiais até a noite ficar dia (com o subsidio de desemprego). 
Eu entrei numa área técnica, a culpa foi minha. Mas se não fosse para uma área técnica e me dedicasse ao origami, tinha de viver com algumas moedas deitadas num chapéu. E isso nem seria mau se, de facto, admirassem a minha arte origami e não me deitassem um par de moedas no chapéu por pena (ai, coitadinha, que não deve ter curso universitário).
A capacidade de imaginar as vivências e as necessidades do outro contraria o Capitalismo. E é do Capitalismo que vivemos diariamente. Promover a qualquer custo o crescimento económico não estimula ninguém a ser melhor pessoa nem a ser-se mais feliz. 
Como Martha Nussbaum* diz, e bem, "Devemos cultivar os olhares interiores dos estudantes. As artes têm um papel fundamental na escola porque enriquecem a capacidade de jogo e de empatia, de uma maneira geral".
É fácil tratar os seres humanos como objectos a manipular, quando nunca se teve a capacidade de ve-los de outra perspectiva. 
Se afirmamos que queremos a democracia e também a liberdade de expressão, o respeito pela diferença e uma compreensão amplificada ao mundo todo, temos não só de ser a favor desses valores, mas também fazer a diferença no ensino e naquilo que está a ser transmitido à geração seguinte, assegurando a sobrevivência desses mesmos valores e transformando o mundo um sitio mais honesto para se viver. 

*filosofa norte-americana contemporânea.  

domingo, 11 de abril de 2010

clever/wise

Um amigo meu pediu-me para escrever algo sobre a seguinte frase: "A clever person solves a problem, a wise person avoids it".

Eu resolvi evitar escrever o texto.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Ontem falei com um senhor na estação de metro Universidad, aqui em Barcelona. Sim, muitos senhores nas estações de metro...mas não costumo falar com eles. Este senhor vinha bebedo que nem um cacho de uvas fermentadas, e por isso ia falando sozinho até que alguém o intercedesse pelo caminho. Mas nunca ninguem o faz, porque nunca ninguém quer falar com um bebedo. E eu também não tenho lá essas coisas por falar com pessoas estranhas e, principlamente, embebidas em alcool barato. Ou caro...porque do alto da minha sabedoria vinicula, eu simplesmente não distingo a diferença. Mas vejo-me muitas vezes a faze-lo (a falar com pessoas estranhas, salvo-seja).
Ele vinha aos tropeços, com os olhos vidrados em algo invisivel, ao qual falava como se ali estivesse alguém. E dizia repetidamente alguma coisa que eu não entendia muito bem. Se custa entender bem um bebedo em português, custa um bocado mais a entender um bebedo em castelhano.
Ele olhou para mim e eu sorri-lhe. Poque não vejo outra coisa a fazer senão sorrir. Não ia demonstrar-lhe medo porque, de facto, medo eu não sentia. Não lhe ia virar a cara porque, uma vez apanhada a observá-lo, não conseguia virar-lhe a cara. Ele aproximou-se e disse-me "aquilo que eu mais queria era voltar a sentir amor". E eu disse-lhe "eu também queria senti-lo". E ele respondeu "Não estás a percerber, o que eu queria era voltar a ver os olhos da minha mãe".
Depois de alguma filosofia metida a pés juntos, ele ainda me convidou para irmos os dois beber até cair, ao qual eu recusei com um "não, estou com muita pressa", porque também não lhe ia dizer "eu não o conheço de lado nenhum e muito menos vou beber consigo até cair". Mas fiquei a pensar nele.
E a pensar na minha mãe e nas pessoas que sempre me demonstraram amor incondicional...e no medo que eu tenho de um dia ser eu a andar aos ziguezagues pelas ruas em busca desses amores perdidos. E no meu pai, a quem já perdi, de facto. E no amor que ele me mostrava só através do olhar, e em como eu entendi aquele senhor. Se tinha ido beber com ele até cair...não, porque eu ainda tenho uma coisa que se chama "juventude" e da qual ainda há esperanças de tirar mil e uma coisas. Só espero que essa juventude não leve a mais ninguém a lugar tao triste...

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

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Finalmente percebi porque existe tanta gente contra a globalização...