segunda-feira, 22 de outubro de 2012

EcceHomo


Cecília Gimenez, uma mulher espanhola de 81 anos, fez-se famosa e esteve debaixo dos holofotes da comunicação social durante várias semanas, após ter arruinado, segundo uns, ou recriado, segundo outros, um fresco do século XIX, que representava Jesus Cristo, “Eccehomo”, na igreja da Misericórdia, em Borja, Zaragoza.

Muitos consideraram-no um atentado “terrorista”. Além de arruinar um fresco original do século XIX, dificilmente recuperável, Cecília atentou também à moralidade e religiosidade de muitos. Sendo ela apenas, e não mais, uma paroquiana devota, sem qualquer formação na área de restauro, e não tendo o aval colectivo dos demais paroquianos para o efeito, Cecília, ainda assim, pegou nos seus pincéis e tintas e tentou recuperar o Cristo que há muito, segundo ela, estava em decadência.
A intenção seria boa, não fosse o seu pouco ou nenhum talento para a representação figurativa e tendo transformado o “Eccehomo” numa pintura digna de uma menina de 5 anos. Feições distorcidas, volumetria perdida e cores empasteladas, cobrindo totalmente a pintura original, a igreja da Misericórdia perde para sempre uma das suas obras mais emblemáticas. Acto este cujo autor original, Elias Garcia, não haveria de ter aprovado. Mas tendo agora a dita igreja um estranho e deformado, mas não menos peculiar, Cristo, numa das suas paredes mais visíveis, já destino de centenas de curiosos.
Mas se por um lado houve milhares de pessoas que ‘crucificaram’ o acto de Cecília, por outro lado, houve milhares que se regozijaram com ele. Afinal de contas, deu que falar.
Em Espanha, e não só, muitos pedem que a obra se mantenha como actualmente se encontra. De entre as muitas considerações, a opinião generalizada é de que se tratou de uma atitude ingénua, produzindo uma obra ao estilo ‘naif’, que em poucos instantes se tornou, igualmente, Pop Art. Canecas, t-shirts, posters, e os mais variados objectos, surgiram com o novo Eccehomo. O Facebook foi invadido por brincadeiras, piadas e dissertações sobre o acontecimento. E o local que seria visitado, anteriormente, apenas por paroquianos locais ou turistas ocasionais, enche-se agora de gente de todos os lados, em busca do tal novo Eccehomo.  
Matisse terá dito que a exactidão não é a ‘verdade’: “Temos que ver a vida como se fossemos meninos”; Picasso proclamou “ Um quadro bom no meio de quadros maus acaba por se transformar num mau quadro. E um quadro mau no meio de quadros bons acaba por se tornar um bom quadro.” Já Andy Warhol, o pai da Pop Art, dizia que nunca se poderia prever o tipo de reacções emocionais que determinadas obras provocariam no público, e que o valor das mesmas estava nessa não-antevisão do futuro e nas reacções emocionais, positivas ou negativas, que surgiriam: “O importante é criar vida.”
Um artista é alguém que produz coisas de que as pessoas não têm necessidade, mas que ele, por qualquer razão, pensa ser uma boa ideia oferecer-lhes. Cecília terá sido guiada por esta premissa. Talvez não seguindo um pensamento artístico, mas um sentimento religioso de preservar a imagem do seu ídolo.
Se ela pode ser considerada artista ou não, está no livre julgamento de cada um, se ela deve ser julgada por ter destruído uma obra já existente, estará, igualmente, no livre julgamento de cada um. Se ela merece reconhecimento e futuros ganhos pela obra produzida já é mais controverso, pois ainda correremos o risco de ser invadidos por restauradores autodidactas em busca dos seus 5 minutos de fama.
Contudo, rir faz bem. E ela, por certo, conseguiu, intencionalmente ou não, o riso de muitos. E conseguiu também eternizar as já eternizadas questões: “O que é Arte?” E “O que é a moral?”.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Salmão com puré de banana


Para quem ainda não fez o jantar ou para a posteridade... partilho o manjar que fiz hoje. :D

Salmão com puré de banana (para 2 pessoas)
- 2 Postas de Salmão
- 3 bananas
- 1 Cebola
- 2 Dentes de Alho
- Meia Curgete
- Azeite, Sal, pimenta e orégãos q.b.

Numa taça de ir ao forno, colocar as duas postas de Salmão, envoltas em cebola e azeite. Temperar com sal, pimenta e orégãos. Levar ao forno cerca de 20 minutos a 190 graus.
Entretanto, cortar as 3 bananas em pedaços pequenos para dentro de uma panela com cebola e azeite. Temperar levemente com sal e pimenta. Mexer até que as bananas se tornem em puré.
Noutra panela fazer o refogado de curgete, igualmente em pedaços pequenos, com azeite e alho.
(Em todas as situações o azeite está presente, mas não há necessidade de ser em grandes quantidades. Uma colher de chá de azeite por cada cozinhado é suficiente)

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

O coxo

Chamava-se Sérgio e era coxo. Por ter perna acima perna abaixo ou por puro desmazelo, nunca o soube, dava passadas tropeças e amiúde lá caia uma das asas da sua mochila roxa-desbotada. A horizontalidade dos seus ombros estava para a verticalidade do seu corpo como uma balança de dois pratos está para uma balança com apenas um.
Mas este filhinho de Quasimodo tinha qualquer coisa de interessante. Os meus 8 anos de idade não o conseguiam racionalizar, mas estava apaixonada. E para validar este meu 'élan', a minha amiguinha de carteira também sentia o mesmo. E o tal do Sérgio, como boa criança todavia limpa de preconceitos e regras sociais, estava apaixonado pelas duas e não se coibia de o demonstrar, mandado-nos cartas forradas de corações e de algumas das poucas palavras que já sabia escrever.
É bom lembrar que as palavras que sabia eram realmente as únicas que importavam: "Eu gostu de vossês".

Não estava correcto, afinal de contas, mas o som era o mesmo. E soava para as duas como um coro dos mais puros anjos.
Além de coxo, não sabia escrever, o tonto, mas, ao que parece, quanto mais tonto era, mais bonito se tornava.

Um dia o Sérgio, o coxo, convidou-nos para o seu aniversário. Quando chegámos à sua casa, entre mãos dadas e risos nervosos, a pequena sala jorrava gente: pais, avós, primos e tios, vizinhos e amigos. Mas nada de crianças. Apenas nós, as miúdas, que éramos o seu presente mais precioso, pois os outros apenas teriam vindo numa de lambarice pelos comes-e-bebes:
- Porque o puto faz anos, mas nem sei bem quantos. Oh Sérgio, diz aqui ao tio, fazes quê? 10?
- Não, faço 8... -  dizia envergonhado.

Os primos mais velhos quiseram por-nos a ver o Jurassic Park. Era idealmente medonho para nos aterrorizar. Enfiadas num só sofá, porque naquela altura ainda cabíamos assim juntas num espaço minúsculo, arregalávamos os olhos para logo os fechar, cheias de medo. E o Sérgio, olhava para nós, provavelmente pensando que não estaria esta a ser a melhor festa de aniversário que nos queria oferecer. É que o encanto do coxo era, afinal, esse mesmo: a ternura. E num tom miúdo e inseguro lá lhes disse para tirarem o filme.

- Ah, 'tou a ver que gostas mesmo das miúdas - disse um.
- Mas oh Sérgio, ter duas namoradas não 'tá certo, tu tens de escolher uma - disse o outro.
O bom do rapaz deixou cair os olhos no chão, e entrelaçava os dedos uns nos outros enquanto pensava numa resposta.
- Eu gosto das duas - disse então.
- Oh puto, não, tens de escolher uma! - insistiu.
- Está bem - disse por fim - Escolho a ela - apontando para a minha amiga.

E nesse momento deixei eu cair o meu coração no chão, desfeito em múltiplas gotas. Foi nesse momento que tive o meu coração partido, pela primeira vez. Teria o garoto feita uma escolha lógica por, afinal, haver uma preferência, ou apenas por se sentir pressionado pelos machos-alfa em seu redor, aquele dedinho apontado, ainda que não na minha direcção, tinha-me atingido como um torpedo.
E estava feita a formatação de dados: Gostar? Só de uma.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

A Rua

O condutor percorria, ligeiro, em cuidados com as lombas e senteças sinalizadas, a rua que eu sempre conhecera, sem mais novidades ou somas, igual ao que sempre fora.

- A minha casa é lá bem à frente ainda.
- De acordo, menina - palitou o taxista.

Uma viagem pelo corredor da minha infância e adolescência, calhau a calhau, arbusto por arbusto, e os metros se foram fazendo quilometros, e os minutos estanques.
Lá fora, no escuro dos candeeiros amarelos, eu me imaginava outra vez andando, com os grilos grilando e os prédios num ressono profundo, e pensei "Eu nunca realmente d'aqui saí".
De volta à mesma rua e ao encontro do que dali nunca saíra, mas que há muitos anos tão pouco presente realmente esteve, vi-me num círculo, cuja ponta é o ínicio da outra. E pela primeira vez, em muito tempo, a sensação de voltar a casa e ao ciclo redondo, me despertou enorme consolação. "Estes calhaus são meus, aqueles arbustos além também, todos os outros, de outras paragens, nunca o foram. A estes eu volto, o trilho dos outros já nem conheço, não deu tempo memorizá-los no coração."



terça-feira, 31 de julho de 2012

A rapariga chamava-se Alma. Tinham-lhe dado esse nome num a ver se ela alguma alma lhes trazia, à vida que já pouco surpeendia. A mãe, Maria Queixume, julgou ver esse brilho, durante os minutos que frouxamente a segurou, no meio das mantas, que apesar de velhas, o sangue não poupou.
Alma tinha, de facto, uma alma. Mas daquelas que vagueiam de um lado para lado nenhum. Silenciosa e taciturna, a miuda cresceu, mas nunca engrandeceu. E o pai de vinho se emborcou, pois a alma que ele queria que Alma fosse, não era mais que a sua que se perdera e nunca mais se avistou.  
Alheia ao peso da sua alma, que pesaria, afinal, coisa nenhuma, ela seguia o seu caminho de ninguém, com os pés presos no chão e nunca mais além.
Um dia a mãe Maria Queixume lhe disse:
-Mas tu não fazes nada? Trouxemos-te ao mundo para nos surpreender e olha o que o teu pai acabou por fazer!". Alma encolheu os ombros e disse:
- Olha o céu, mãe. Aquelas estrelas brilham tanto, e estão sempre no mesmo lugar".


quarta-feira, 4 de julho de 2012

Quem espera sempre alcança, já dizia o ditado. Mas eu o desdigo, sem troça. Quem espera desespera, diria então o outro. E esse já cabe em mim com todo seu sentido. Na espera do esperado, desespera-se porque já sabemos o final que irá ser contado. Mas na teimosia do esperar, porque sabendo que se chegasse já deveria ter chegado, vamos reconhecendo que, afinal, o que se teima é não querer desteimar. No desteimar, perde-se a ilusão daquilo que poderia ser, mas nunca será. Nunca será, mas poderia ser.
Há este doce afago que aquece as ilusões, personificando-as no desejado. Pois são elas, afinal, que esperam por nós, todos os dias e todas as noites. Enrolam-se aninhadas no pescoço, amarram-nos os braços e tapam-nos os olhos, e deixamo-las estar, assim enganadas, enquanto pensam que quem nos engana são elas.
Há um rio que atravessa a casa. E as memórias vão nadando contrariando a corrente. Não querem ser levadas e buscam sustento. Estão todas desgrenhadas, já não lhes resta vaidade, apenas arrependimento. De não terem sido salvas a tempo.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Snooze

Is there something better than a snooze?
I "snoozed", you "snoozed", he "snoozed"... even the verb itself sounds good even being completly wrong. I love wrong things.
It's good we all "snooze" for a while. You see how grandious everything tiny can be, you see how tiny everything grandious is, too. And the medium keeps being medium. It doesn't exist. It keeps being absent.
The wonderful meeting with a snooze: waking up and not even remembering your name. And when you eventually remember it, spelling it as the most surprisingly thing you have ever discovered in your entire life about yourself.
My name is Ana. A-n-a... That's really strange. I have never though that me, myself, was actually represented by a sound. I knew I was, I just never though about that. So... maybe I didn't really know.
How many people really think about the sound that represents themselfs? We all have a label. And the majority of our label's don't really mean anything, but they have a energy. How maybe not really a energy, that is getting to much "ying yang" here... But it is something quite funny, it is something immutable. Never changes. I was born and I was giving this name and I will die having this name. Even if I decided to change it to "Debora Cristal", I guess there will be dozens of people who will never forget my original name. I will be always Ana. Liking it or not.
After a snooze. After a snooze I got emotional about my name. Not because it's beautiful. Just because it is a freaking sound my parents put on me and it will never change. I found it interesting. And such a short sound. It really sounds...quick. Simple. And easy.
Now I understand why everyone calls me Luelmo instead.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

professionalism vs feeling

That's it.
We can not be good professionals if we feel. Well... the majority of times.
A friend of mine told me how disappointed he was about a friend of him, who he recomended to a "big guy" of a "big company" and to whom this friend sent an horrible curriculum like if he didn't care. And my friend asked me "Why did he waste his time like that?".
I said.. "Man.. I don't know. Maybe because he was not so into it,... why to go against it?"

I am working too many hours a day, I guess. And I guess I am working well while I am working, but in the end of the day I just want to "put them on the bitches", sorry my french/portuguese! And if I had to send a curriculum to these guys again I would say "I am wondeful, but don't try to get more than what I have to give. My wonderfullness has an end".
He gave right away what he had to give. And he was not accepted. Correct... Fail!
Because, yes.. we all end up giving more than we have to give, and that is not so good after all. This guy knew it already. As I knew it already, also. But I needed this job, anyway. Lucky him, he didn't need it so much.

Now I am just thinking how amazing would it be to wake up and to do exactly what I want to do. Without anyone saying
- Listen, your curriculum looks a bit.. vague.
To what I would like to answer:
- Listen, your belly got very big in the lats years, didn't it?